Um texto de Claudionor Gomes
Bye
Bye, Brasil (1979) é um daqueles filmes que servem bem aos nostálgicos que
tentam relembrar sua época, mas sobretudo inaugura os olhos para um Brasil
novo, que estava prestes a nascer. É marcante e historico em diversos pontos:
seja diante dos aspectos técnicos por parte do uso inteligente da cinegrafia,
seja da proposta do filme em termos de ficção, seja por registrar em seu
conteúdo os costumes de uma realidade e trazer reflexões que ressonam ainda nos
dias atuais. Tendo sido dirigido pelo mundialmente conhecido cineasta Cacá
Diegues, o longa situa-se numa época em que trabalhar técnicas de ficção no
cinema nacional é vista como um grande avanço, o que fez com que o trabalho do
diretor maceioense fosse indicado em 1980 à Palma de Ouro no Festival de Cannes,
além ganhar os prêmios de Melhor Diretor e Coral Especial no festival de
Havana, em Cuba, no mesmo ano.
Classificado
no estilo comédia, o filme passa em algumas cidades alagoanas (uma escolha
particular de Cacá Diegues em vender as características de seu estado), além de
Brasília e Manaus. Retrata um grupo de pessoas que vivem fazendo espetáculos
para ganhar a vida: um homem que se destaca pela força, uma mulher dançarina e
um mágico, além de um sanfoneiro que decide fazer parte do grupo depois de uma
visita da caravana à sua cidade. Dentre outros aspectos, o filme retrata os
costumes e as construções de cidades como Piranhas, Maceió e Murici. As imagens
desses locais adquiriram uma função historiográfica importante ao compararmos o
espaço e contexto da época com as mesmas regiões nesse século XXI. Apesar da
ordem fictícia do filme, a proposta aparente da direção foi retratar os
figurantes com a natureza própria da época, seguindo traços genuinos da região,
tal qual a sociedade se pautava.Dessa forma, é possível encontrar traços da
vida setentista, marcada não só pelas vestes e arquitetura, mas o modo de vida
dos habitantes de cada cidade: os veículos, valores e preferências de consumo.
A
história da Caravana Rolidei mostra-se dramática quando, em algumas cidades em
processo de desenvolvimento, as TVs começam a ocupar o tempo livre das
famílias, concorrendo diretamente com atrações diretas, como circos e
espetáculos de rua. Dessa forma, o advento da TV e a massificação da cultura
como um problema faz com que as "espinhas de peixe" (antenas) sejam
odiadas pelos membros da Caravana, que se viam obrigados a seguir em direção a
cidades cada vez menores para adquirir uma audiência aceitável. Assim, as
cidades pouco desenvolvidas, ainda resistentes à modernização - ou sem o
advento desta -, eram o espaço do ganha-pão ideal da Caravana Rolidei.
O
dilema passado pela Caravana Rolidei nos revela uma situação histórica do
desenvolvimento não só do nordeste, mas do mundo como um todo: vemos portanto
em Bye Bye, Brasil o embrião daquilo que se desenvolvia freneticamente e cada
vez mais rápido nas gerações seguintes: a globalização.
A
cena mais marcante, na minha opinião, foi rodada em Murici-AL, quando a
personagem de José Wilker, o Lorde Cigano, enfurecido com o fato de o prefeito
ter inaugurado uma praça com TV que fica por trás da Igreja Santa Tereza (que
por sinal ainda existe como entretenimento de rua), resolve realizar um truque
que sabota e explode a TV, desviando a atenção da população que outrora se
mostrara fissurada pela programação. Tal atitude significa o ápice do ódio
sobre a cultura de massa, que comprova domínio sobre aqueles que se doam àquela
"novidade".
Eis
as falas que considero emblemáticas ditas no filme:
"Artista
de televisão é tudo viado. A igreja devia excomungar essa pouca vergonha".
(O mágico Lorde Cigano para o padre da cidade, que assistia TV junto com a
população em Murici).
"Enfiem
as antenas no rabo!" (Lorde Cigano para os guardas).
"Você
é do Brasil?" (Indígena expulsa de sua propriedade na Transamazônica
perguntando a uma mulher da Caravana)
O
elenco conta com José Wilker, Betty Faria, Fábio Júnior, Marieta Severo, o
alagoano Jofre Soares, entre outros.
É
um filme que, apesar de ter já seus mais de 30 anos, mantém o debate acerca das
preferências de formas de entretenimento diante do desenvolvimento tecnológico
de produtos consumidos em massa. Vale muito a pena assistir!
Curiosidade:
a música Bye, Bye, Brasil de Chico Buarque, homônima ao longa, foi produzida
como música-tema e tem muita relação com as regiões e situações tratadas na
estória.
Cenas do filme >>
Depoimento de Cacá Diegues sobre Bye Bye, Brasil >>
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