Arn: O Cavaleiro Templário


Por Wanderson Gomes


O filme de drama romântico dirigido por Peter Flinch e de título original “Arn: The Knight Templar” foi ambientado na Suécia, tendo seu contexto histórico resumido as guerras sangrentas ocasionadas na disputa de cristãos e mulçumanos pela Terra Santa, por volta de 1187. Em alguns importantes instantes da trama, os protagonistas, Arn Magnusson e Cecília Algotsdotter, subvertem as ordens severamente estimuladas por seus líderes religiosos, culminando numa transformação completa nos rumos de seus respectivos destinos.

Aqui, não há muitas inovações, se compararmos aos filmes que se igualam ao gênero de romantismo trágico. O esquema tático para alienação do espectador é o mesmo, onde podemos citar: a trama exageradamente prolongada; história inicialmente exposta de um período avançado na vida dos protagonistas e, depois, retrospectiva dos principais acontecimentos que levaram a esse estado; mocinho se afasta da bela donzela, tempos depois retorna ao calor de sua terra e de seu amor, mas, como de costume nessas ideologias fílmicas, são novamente separados por um empecilho forte e definitivo (neste caso, a morte), entre outros. Entretanto, mesmo encaixado nos padrões que tornaram longas desse gênero demasiado torturantes ao equilíbrio do consumidor, é-nos única a benção da potencialidade maior que intitulo de “individualidade ótica”. Um artifício altamente variante de acordo com as distintas experiências e culturas da vida humana e que nos permite enxergar um pouco mais além do “corpo aparentemente morto”. É essa tentativa que se fará aqui.
Introdutoriamente contextualizemos Arn e Cecília, que compartilham um amor proibido. Os dois eram separados apenas pela comum e conservadora educação de gêneros e nada mais. Eram regrados no Mosteiro para a vida em serventia a Deus. Arn, submetido a rígidos treinamentos para aperfeiçoamento das táticas de guerra, se preciso fosse sua iniciação em campos de batalha. Mas, a prioridade era sua dedicação como líder espiritual, portanto, era intelectualizado pelo treinador e amigo Gilbert. Por sua vez, Cecília se limitava a algumas possibilidades da monótona vida no convento como, por exemplo, leitura, canto, além da total submissão as leis internas, tidas como “leis de Deus”, bem como aguardar a indicação de um nobre para casamento, por parte da sua família. Como em Romeu e Julieta, essa trama nos oferece uma divisão irreparável entre dois povos, onde os “inimigos” sãos os chamados “Esverkers”. Mas, diferentemente de Romeu e Julieta, a oposição vai para além do embate ideológico, passando para o campo da materialidade fútil visto a seriedade dos confrontos, como brigas por território e a produtividade ruralizada. De um lado a família de Arn, de outro, os Esverkers, relação inconciliável onde a luta de ambos se resume na unificação da Suécia, assim, um clã teria que ser extinto. Contudo, a discrepância de valores entre os dois clãs não impediu que Cecília, então prometida a um nobre Sverker por seu pai, se apaixonasse por Arn, gerando um fruto: um menino batizado de Magnus. Subvertendo o sistema interno do Mosteiro, Arn e Cecília tiveram como consequência o excomungo, com pena de 20 anos, decretado pelo Clérigo, especialmente após injúrias desferidas pela irmã da moça, afirmando possível caso com Arn. Na despedida, Arn, emocionado, implora pela confiança de Cecília, ao jurar que jamais houvera se deitado com sua irmã e, num lapso de revolta do roteiro, ela acredita no cavaleiro, presenteando-o com um crucifixo, como símbolo do amor e da esperança por dias melhores para os dois.
Cumprindo pena no Monastério, Cecília é afastada de seu filho após o parto, como um demônio enjaulado expulso por uma serva do Senhor, isso na ótica da infernal irmã Rikissa, também conhecida por seu castigo dos “três açoites” (Pai, Filho e Espírito Santo) por qualquer transgressão de suas leis. Arn, devendo se afastar daquelas terras, recebe uma carta do Bispo de Varnhem onde é nomeado um cavaleiro Templário, e tendo por objetivo viajar em busca da Terra Santa e seu domínio. Até ai nada de surpreendente! Mas se o amigável leitor ainda não pegou no sono, irei injetar mais ânimo: posso citar uma sucessão de ridículas passagens do roteiro, onde se visualiza a centralidade e unilateralidade do diretor Peter Flinch para denominar cristãos católicos como “bem feitores” na “Guerra Santa”, além de não abordar sequer a “lógica” do sangue derramado, co-optando heróis e monstros (transmitindo tais idéias até nos figurinos dos personagens, onde o cavaleiro Templário é forte, possui armadura reluzente e espada longa e afiada, enquanto o mulçumano é de aparência suja, poder bélico limitado, constituído de armas arcaicas em comparação ao inimigo na batalha). Já em terras hostis, Arn, em confronto com uns capangas, salva a vida (poupa, por melhor dizer) do mulçumano Saladino e seus subordinados. Dessa forma, para o espectador que já escolheu o Templário como “do bem”, resta intitular como “do mal” os muçulmanos, contra quem Arn luta. Tempos depois, o cavaleiro Templário, antes da batalha decisiva, é nomeado por seu Grão-Mestre como o líder das tropas contra o exército de Saladino. Na batalha, Saladino, vitorioso, paga o “favor” e também lhe poupa a vida. Essa relação honrosa de favores deveria ser mantida para que o personagem fosse preservado até certos instantes da trama, mesmo sendo visível a dizimação de cristãos combatentes no período. Apesar de garantir o domínio sobre Jerusalém em dado momento com seu exército, Arn volta para casa, derrotado, e com cicatrizes maiores que sua decepção. No Monastério, uma cena no mínimo hilária. Madre Rikissa, em seu leito de morte, pede a presença de Cecília Algotsdotter e, segurando forte sua mão, pede seu perdão. Mas o arrependimento aqui não é o foco e sim a busca, da irmã, por “facilidades” na passagem pelo purgatório. Quando ouve um claro: “_Só Deus pode lhe perdoar!”, a irmã, desnorteada, explode em raiva e gritos histéricos. No filme, ao menos, o autor se permite seguir os ritmos da religião, ou seja, numa situação, o Grão-Mestre de Arn dispensa suas estratégias para vencer Saladino, creditando toda possibilidade de triunfo contra o lado oposto no símbolo da cruz. O resultado da batalha já fora dito anteriormente. Agora, Madre Rikissa, em sua cobiça pela salvação, fica cega na busca pelo perdão. Conclusão dos aspectos roteirísticos: religião = dominação = alienação = = acomodação = limitação!
Sem sucesso na batalha da Terra Santa, Arn volta, anos depois, para casa, procurando abrigo, paz e óbvio, o reencontro com sua amada. Cecília já não estava mais no convento, havia sido ajudada pela então nova Rainha, que conhecera e que lhe tinha amizade. No Reino, Cecília realizou um dos sonhos e conheceu seu filho apartado, Magnus, jovem sadio, sustentado por um nobre cavaleiro de seu clã. Mas, também no Reino, Cecília recebeu a notícia por um informante que menos queria ouvir, a da eliminação das tropas dos cavaleiros Templários em solo inimigo. Tendo a certeza da também morte de seu amado, ela volta para o Convento em busca de concluir aquele que pensava ser seu destino. Mas, surpreendentemente, recebe a porta Arn, e compartilham um reencontro emocionante, recheado de suspiros e lágrimas, beijos e abraços. Parecia que nada mais iria impedir essa felicidade. O casal, junto ao filho Magnus, passou a construir vida nova, em sua casa, na terra onde o sol sempre brilhou para suas famílias. Lembra da briga entre os clãs que citei inicialmente? Quem iria adivinhar que Arn seria morto pelo combate menos rigoroso, por uma briga interna de selvagens incapazes de conciliar as vidas na Suécia “pequena demais” para ambos. Pois assim o foi. Arn, após a batalha, voltou para casa e, não aguentando aos ferimentos, morreu nos braços de seu grande amor, em frente ao filho, cavaleiro igual a ele.
Se Arn morresse por uma das duas causas, mesmo assim, teria morrido por nada, ou melhor, por falta de tolerância. Isso é óbvio e fácil afirmar. Mas o que não é tão fácil perceber e que necessita de maior paciência em crer é a postura do roteirista em preservar a guerra em si, ou seja, “quero fazer uma história de amor... Preciso de um contexto... hum... Que seja a Guerra Santa!”. E alternando entre bons momentos e entre “sacadas” de profissionais principiantes, o filme entedia e se objetiva em colunas estanques de destinos óbvios e superficialidades que não passam do título: “ARN: O Cavaleiro Templário” e só. Não é desperdício por completo pelo fato de que abre uma porta para a discussão do conservadorismo gritante e dos valores “melhores” que outros, como na interpretação das religiões, isso é, se você ainda não assistiu o filme, pois, se já, acredito ser difícil retirar o conceito negativo anexado aos mulçumanos, fundamentalmente pela aparência e vozes malignas destes na trama.


Assista ao trailer:

        

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