Uma Vida Iluminada - Onde estão nossas lembranças?


Excelente filme para quem aprecia a arte cinematográfica, “uma vida iluminada” é dirigido por Liev Schreiber (em sua estreia na direção) e estrelado por Elijah Wood, brilhantemente estrelado, diga-se de passagem. Podes está se perguntando o porquê que eu intitulei esse texto de “onde estão nossas lembranças?”, pois bem, antes de qualquer coisa gostaria de dizer que o filme é um elogio a história e ao passado como parte predominante em nosso presente. A modernidade nos leva a não dá a devida importância para as nossas lembranças; em uma sociedade dita moderna as lembranças são deixadas de lado, pois “o passado deve-se ser esquecido e jogado no mar do esquecimento”. 

Não entendemos o passado como fundamento para o nosso presente, o que realmente importa é o que você é, e o que você faz, para colher os frutos no futuro. “Uma vida iluminada” vai mostrar exatamente o contrário, o passado não é o passado, ele está mais presente do que nós podemos imaginar.

Família, tradição, origens, passado e diferenças culturas regem o seu roteiro. Contando a história de um jovem, Jonathan Safran Foer, tipicamente americano, ver seu avô, de origem judaica nascido na Ucrânia, morrer. Ele, devido ao seu avô, se tornara um colecionador, compulsivo/obsessivo, onde tudo, realmente, tudo ele colecionara. A figura de um colecionador me remete a um sentido da ideia de “colecionar coisas velhas, antigas”, mas não é o que Jonathan Safran faz. Ele, portando uma ponchete cheia de sacos plásticos, coleciona tudo que encontra ao longo de sua vida, uma vez perguntado sobre o porquê ele colecionava tudo, ele respondera: “eu não sei, talvez seja por que tenho medo que esquecer”. Nós também temos medo de esquecer o que aconteceu conosco, mas creio que não é exatamente o sentido que o jovem Jonathan quis transmitir. O sentido que Jonathan, a meu ver, transpassa a ideia de passado como um passado, tudo que ele coleciona não é deixado apenas na memória, mas sim junto com ele, literalmente, o que ele coleciona podemos dizer que são as suas lembranças e as lembranças de sua família transportada junto com ele.

O filme começa com uma narrativa de Alex/neto contando a sua estranheza para com o povo judeu, beirando ao preconceito. Ao longo da fala, apresenta a sua família, dentre eles o seu avô, Alexander Petrov. Alex/avô condiciona seus interesses e sua identidade a partir de sua cegueira artificial, dá a impressão que ele só quer enxergar aquilo que quer ver como uma determinada “verdade” escondendo um passado. Jonathan, depois da morte de seu avô, mergulha em uma busca incessante, ou como é mencionado no filme, por “uma busca rígida” pelas suas origens. 

Na Ucrânia, ele encontra um jovem típico da cidade e seu avô. Alex/neto e Alex/avô, dois personagem bem peculiares. Os três personagens caminham ao longo da “busca rígida” em um carro onde está escrito “heranças” remetendo a idéia daquilo que guardamos em nossa história ou como diz Bourdieu, aquilo que condiciona o nosso “habitus”, o capital cultural interno. O filme é baseado no primeiro livro de Jonathan Safran Foer, "Tudo se Ilumina” deve ser por esse motivo que o roteiro é dividido em capítulos escrito pelo próprio Alex/neto. Ele, dentro do roteiro, é colocado como um mediador/tradutor daquilo que Jonathan, que em sua pronúncia torna-se Jonfren, falaria ao seu avô; mas a função desse personagem da tradução, através de suas perguntas por vezes ingênuas, mas que possuem em si a discrepância cultural e o choque de identidade perceptível no diálogo ao longo do filme.

Posso analisar a configuração desses três personagens. Jonfren/Jonathan é o colecionador a procura obsessiva por suas origens; Alex/neto, o mediador, numa essência quase terapêutica; Alex/avô, que procura esconder suas origens judia a qualquer custo.
O panorama do filme é centralizado na busca e na definição do que é parte constitutiva de nossas lembranças. Ambientalizado indiretamente no cenário do holocausto judeu, o filme trata de duas visões de como nós tratamos nossas lembranças. Primeiro, na figura do Jonfren, que ao encontrar a mulher que conheceu seu avô, na Ucrânia, encontra suas origens, e encontra a iluminação da vida. Já para Alex/avô, que sempre negou a sua origem judaica, a “busca rígida” mostrou pra ele que é impossível nos separamos do passado. O passado, como disse no começo do texto, é parte fundante na construção do nosso presente e de nosso futuro, ao perceber isso, Alex/avô também teve a sua iluminação, preferiu ser enterrado com suas lembranças, pois não significava mais viver a partir daquilo que tanto quis esconder.

Uma cena muito interessante é quando Jonathan/Jonfren volta ao E.U.A, e ainda no aeroporto ele “encontra” todas as pessoas que ele outrora viu em sua viagem na Ucrânia. Realmente, o passado não é passado. Repleto de cenas impagáveis de humor, e confusos de linguagens e de uma peculiaridade na construção psicológica dos personagens que transcende a mera observação superficial do chamado “cine pipoca”, este filme é para levarmos em nossas lembranças.


Assista ao trailler:

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