EGOÍSMO TÍPICO
Para compreender as minuciosidades de toda a trama é preciso uma atenção redobrada, que logicamente não se resume a este longa, mas toda a saga Crepúsculo que complementa as trajetórias de vida do pseudo-triângulo amoroso, formado por: Bella (Kristen Stewart); Edward (Robert Pattinson) e Jacob (Taylor Lautner). Ou talvez nem seja necessária uma atenção tão redobrada assim. A saga, imaginada e escrita pela mente conturbada de Stephenie Meyer, é marcada por oferecer (ou ao menos buscar oferecer) uma gama de tentativas... Isso mesmo, nada mais que tentativas. Tentativas de transferir ao expectador uma viajem ao universo dos vampiros ou tentativas – mais que frustradas – de retratar a vida dos lobisomens.
Como se não bastasse, o filme, dentro dessa conexão monstruosa que um dia já fora tão atraente, põem-se tentar refazer os já conhecidos triângulos amorosos. Entretanto – pergunta meu estimado leitor – qual o motivo de se considerarem os esforços desse filme nada mais que breves e frágeis “tentativas”? É exatamente o objetivo dessa análise. Aquilo que iremos conhecer nas próximas linhas.
Lua Nova (New Moon, em seu título original), foi dirigido por Chris Weitz, produzido por Wyck Godfrey e Karen Rosenfelt. O longa não teve dificuldades em dar continuidade ao imenso sucesso que a saga Crepúsculo proporcionou ao mundo do cinema da indústria de massa, especialmente dilatado pelo êxtase infanto-juvenil, a partir dos seus sonhos em paixões dilacerantes e imortalidade inflada pelos ditos ridiculamente passados a frente, como o “te amarei para sempre”. No entanto – e aqui o motivo ao qual explica a escolha desse filme em específico – se olhado mais atentamente, longe dos suspiros e gritos histéricos ocasionados pela estética já tão batida, o romance pode nos dizer algo mais.
As tentativas a que me referi no início desta leitura são oferecidas como contrapeso, ou seja, um contexto mais abrangente e mais “culto”, como contos de vampiros e lobisomens que se poriam a dar “corpo” ao que subliminarmente a autora quer passar. Mas me atrevo a dizer que essa trama “não tá nem aí pra isso”, popularmente falando. Assim como exerço minha autonomia aqui para falar com a linguagem que me der na telha, para passar a informação que eu quiser e que eu medir ser necessária, Stephenier Meyer criou, do nada, um conto sobre aquilo que ela sempre quis visualizar em vampiros. Em momento algum ela obedeceu ou respeitou décadas e décadas de produções sobre essa espécie, a não ser pelo insubstituível ato de chupar alguns litros de sangue para saciar a cede e repor as energias. E os lobisomens? Esses eu considero como os mais afetados. Não quero me prolongar aqui, mas se houver curiosidade posso em outro momento e espaço destrinchar sobre a história dos lobisomens, bem como sempre foram retratadas com raras mutações, e a história quase erótica dos descamisados lobisomens adolescentes de Stephenier Meyer. Mas, vamos prosseguir. Falta um item no rol de tentativas do filme que nem de longe cumpriu o seu papal: o do triângulo amoroso. A esse eu ofereço um pouco mais de paciência para conversar com vocês, meus caros leitores.
O que chamo inicialmente de pseudo-triângulo amoroso (“pseudo” ou “falso”, dá no mesmo) é assim intitulado pelo simples fato de que não o é, não o foi e não o será jamais um “triângulo” amoroso. Bella sempre esteve ligada a Edward. Sempre o amou. Sempre o quis. Então, qual o motivo de criar um personagem de fora desta relação e iludir aqueles que acompanham a trama com uma possível possibilidade de “troca de amores”? Impossível alguém achar que Bella fosse mesmo dar bola ao Jacob, não é verdade? Se você pensou assim certamente foi ludibriado, e precisa re-assistir o filme outras mil vezes. Aquilo que Bella faz para aproximar Jacob não é nada mais que joguinhos egocêntricos de sedução feminina para curar (ou pelo menos tentar curar) uma dor que a incomoda fortemente: a dor da partida de Edward. O vampiro bonitão se vai, achando que assim vai proteger sua amada e que ela viverá uma “vida normal”. E você? Se você possuísse habilidades especiais e estivesse sempre ao lado de um grande amor, e ao seu lado enfrentasse inimigos, percebendo claro que seus grandes inimigos já a teria conhecido e já ligariam automaticamente sua imagem a dela, iria embora? Acredito que não, ninguém seria tão tolo. Será que ela conseguiria ter uma “vida normal” depois de conhecer um chupador de sangue? Aparentemente o que sobra em “beleza” a Edward, massivamente compartilhada pelas jovens (em sua maioria, virgens), falta-lhe em cérebro. Mas, voltemos ao nosso objeto nuclear. Vou provar que o triângulo amoroso jamais existiu. Atentem para a citação:
Bella Egoísta Swan diz: “Alice (irmã de Edward), eu fico bem... Até ficar sozinha.”
Percebem o mesmo que eu? Jacob não era nada mais que um passa-tempo para cicatrizar feridas que ainda sangravam com a mesma intensidade das cascatas de uma cachoeira. E o pior, Bella jamais se jogou em seus braços, nunca cogitou esta possibilidade, mas também não disse que não. Ela precisava dos “trabalhos” de Jacob ao seu lado, para fugir da escuridão e do silêncio que ainda a fazia lembrar-se dos momentos incrivelmente fantasiosos com Edward. Embora seja uma história que tenha falhado em suas “tentativas” contextuais, ela nos faz pensar: será que está tão longe da realidade? Bem, dentre os três filmes da saga lançados, esse é aquele onde as vísceras do casal comum ficam mais expostas, onde a dor, o medo da velhice (que se reflete no medo de Bella ao completar idade nova), o medo de ficar sozinho, são atributos normais a carne e ao osso. Todos são obstáculos tão próximos a nós, são tão íntimos aos nossos propósitos de vida. Quem não quis que um momento fosse eterno? Quem nunca teve medo da morte, não por si mesmo, mas simplesmente para não deixar algo ou alguém para trás.
No fim, Bella, que passou a se engajar numa vida eminentemente perigosa para “tentar” ser salva pelo seu herói, se arrisca em um penhasco e passa maus bocados. Tendo visualizado tudo, como inexplicavelmente Alice faz, a informação de um possível “suicídio” chega ao conhecimento de Edward, que havia ido ao Rio de Janeiro para as gravações do quarto e último filme da saga (brincadeirinha). Desesperado e tentado a reproduzir a história trágica de Romeu e Julieta do início do filme, Edward procura a única forma possível naquele momento para também se matar e não viver em um mundo onde sua amada não mais estaria. Para Edward, a única forma de se matar seria infringindo a lei primordial dos vampiros, de não-aparição em público, o que revelaria a espécie. Do contrário, o vampiresco apaixonado seria severamente punido pelos Volturi, um tipo de grupo líder, os “cabeças do bando”.
No último instante antes da aparição, Bella, vivinha da silva, abraça seu amado (como sempre o foi) e não evita em aplicar-lhe um beijo na mesma hora. Confesso que não me contive e vomitei litros de sorriso nesse momento, pois imagina a situação: Bella é abandonada. Ouve absurdos de quem sempre amou. Entra em uma depressão quase mortal. Aproxima-se do coitado do Jacob. Afasta-se do coitado do Jacob para salvar a vida de quem a abandonou. Tasca-lhe um beijo sem pensar duas vezes, enquanto que o coitado do Jacob vem tentando o mesmo beijo durante a saga toda. Não é justo! Não é justo! Não é justo mesmo!
O modelo dessas tramas perpassa a necessidade do suspense, mesmo sabendo-se o que vai acontecer e como vai ser seu fim. A “tentativa” de cortar a previsibilidade, apenas ingere algumas doses de irracionalidade abusiva, abusiva por que sempre há irracionalidade, ou então não seria um filme.
Não é justo o desenrolar da trama, mas de tão injusto, torna-se imperdível.
Wanderson Gomes
Assista ao trailer: